08 dezembro, 2007

Sem depois



Todas as vidas gastei

para morrer contigo.

E agora

esfumou-se o tempo

e perdi o teu passo

para além da curva do rio.

Rasguei as cartas.

Em vão: o papel estava intacto.

Só os meus dedos murcharam, decepados.

Queimei as fotos.

Em vão: as imagens restaram incólumes

e só os meus olhos

se desfizeram, redondas cinzas.

Com que roupa

vestirei minha alma

agora que já não há domingos?

Quero morrer, não consigo.

Depois de te viver

não há poente

nem o enfim de um fim.

Todas as mortes gastei

para viver contigo.


Mia Couto

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